O que é Indústria Cultural Por Teixeira Coelho

 

A terceira onda de inovações sociais e tecnológicas impulsionada pela digitalização da vida é a “gamificação” das redes - sociais ou de coisas. A convergência digital é caleidoscópica. As mídias são múltiplas e propiciam novas formas de monetização do entretenimento, do lazer, da intimidade. Os principais fenômenos da conexão planetária em rede dos últimos cinco anos são a conversão ampla e generalizada das pessoas conectadas a redes sociais, como o Facebook, e a consolidação de uma nova economia digital planetária, com destaque para a internet das coisas e a gamificação.

Gilson Schwartz, Revista Galileu. Fevereiro 2015


O que é Indústria Cultural

Por Teixeira Coelho


José Teixeira Coelho Netto é um pesquisador brasileiro especialista em Política Cultural. é Graduado em Direito pela Universidade de Guarulhos. Em 1976 concluiu o mestrado em Ciências da Comunicação pela USP, o Doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada também pela USP e pós-doutorado na Universidade de Maryland, nos EUA, em 2002. Atualmente é curador-coordenador do Museu de Arte de São Paulo e professor aposentado da USP. O autor possui hoje mais de 40 publicações. O livro “O que é Industria Cultural” foi publicado pela primeira vez em 1980, como parte integrante da coleção “Primeiros Passos” e visa fazer um panorama da produção cultural humana, defendendo que os produtos da sociedade são produzidos para ela e sobre ela por ela mesma. 


O autor inicia a sua argumentação expondo que a cultura de massa, produto de uma indústria cultural, é caracterizada principalmente pela baixa participação na troca de informações entre um emissor e muitos receptores, surgiu  juntamente com o surgimento no século XVIII, da economia de mercado, baseada no consumo de bens, e da sociedade de consumo surgida a partir da metade do século XIX. A cultura de massa, segundo o autor, é capaz de atravessar as classes sociais "com uma intensidade e uma frequência maiores do que se costuma pensar" (COELHO, 1980, p. 9). Diferentemente da cultura popular, definida como "a soma dos valores tradicionais de um povo"  (COELHO, 1980, p. 11), a cultura de massa tem efeito narcotizante através da ênfase ao divertimento, fornecendo para os "clientes", ocasiões para fuga da realidade. A cultura de massa, assim, aliena por forçar o indivíduo a "perder ou a não formar uma imagem de si mesmo diante da sociedade" quando "é levado a não meditar [...] sobre a totalidade do meio social circundante, transformando-se com isso em mero joguete e, afinal, em simples  produto alimentador do sistema que o envolve.” (COELHO, 1980, pgs 12 e 14).


Teixeira Coelho escolheu a TV para exemplificar o poder da indústria cultural, mas deixa claro de que a indústria cultural está presente em outros meios como o radio (e estendo aqui para a Internet), e pode ser verificada sob cuidadosas análises. 


Segundo o autor, a indústria cultural é errôneamente avaliada através da apreciação dos conteúdos produzidos, tornando-os determinantes à natureza alienante ou não a partir da mensagem veiculada. Esse tipo de observação dependeria de ponto de vista ideológico e necessitaria de observações individuais.  Ele sugere então a análise estrutural: Como a indústria cultural opera o seu significado, saindo de uma analise técnica para uma analise estrutural. Para isso, Teixeira Coelho utiliza-se da Semiótica, a ciência que estuda os processos de significação. Nessa análise são interpretados os signos (unidades de significação) que podem ser divididos em três: os ícones (signos que fazem analogia à algum objeto, como uma foto de uma pessoa a representa), os índices (signos capazes de representar seu objeto remetendo-se diretamente a ele, mas sem carregar significado próprio quando isolado, como o conceito de que ver nuvens escuras nos leva a acreditar que vai chover) e os símbolos (convenções em que um signo passa a representar algo, como as palavras representam objetos, mas não têm ligação nenhuma com o objeto que representam). O problema não é o que a indústria cultural mostra, mas em como ela mostra, utilizando-se de informações indiciais em alta rotatividade de assuntos, uma vez que o "índice nunca aponta diretamente para a coisa em si, mas sempre para algo que não é a própria coisa. No máximo, aponta para qualidades indicativas da coisa." (COELHO, 1980, p. 30). 


"[...] não há tempo, para a intuição e o sentimento das coisas, nem para o exame lógico delas: a tônica consiste apenas em mostrar, indicar, constatar. Não há revelação, apenas constatação, e ainda assim uma constatação superficial — o que funciona como mola para a alienação. O que interessa não é sentir, intuir ou argumentar, propriedades da consciência icônica e simbólica; apenas, operar." (COELHO, 1980, p. 30)


Na época em que a TV era o grande meio de comunicação, mesmo com a qualidade baixa,  as informações mantêm seu caráter "um-para-todos", gerando um processo que Teixeira Coelho chamou de conformação: "a TV é um meio unidirecional, unívoco: a informação por ele veiculada segue apenas um sentido, da fonte para o receptor, sem retorno. Com isso, na verdade não há informação mas formação. Nem isto, mas conformação." (COELHO, 1980, p 24). 


Dessa forma, o autor nos convida a observar  a indústria cultural sob a perspectiva estrangeira, ressaltando que "é forte a tendência no sentido de dizer que a indústria cultural é manipulada com esse objetivo, e embora possa ser verdadeiro que a partir de um certo momento isso se verifique, será mais adequado dizer que a própria sociedade vai lentamente gerando seus instrumentos e suas tendências" (COELHO, 1980, p 31), evidenciando que a dita "maquiavélica" indústria cultural é produto de uma sociedade em que ver cada vez menos o sentido das coisas se torna mais importante. 

"o campo coberto pelo rótulo "indústria cultural" é receptivo à tomada de posições dogmáticas montadas sobre juízos de valor sobre o que é bom ou não para o indivíduo e o grupo social. [...] apesar disso e por causa disso, é necessário estar sempre procurando proceder a uma análise viva, dialética, dos aspectos em jogo[...]. (COELHO, 1980, p. 41)


Considerando ainda necessária atualização ao texto quanto à evolução tecnológica, a qualidade da TV aumentou significativamente, com transmissões via satélites e fibra ótica e o rádio apresenta relativo decaimento, o texto já está ultrapassado quando tenta, nos últimos capítulos, fazer um panorama da indústria cultural no Brasil: a Internet se tornou muito popular, sendo considerada pela ONU em 2011 como um direito humano. As redes sociais, que se tornaram populares após os anos 2000, são hoje grande fonte de informações, muitas vezes atualizadas minuto a minuto, tornando o processo de industrialização da cultura ainda mais acelerado. A televisão saiu do espaço privilegiado da sala de estar e está nos bolsos dos brasileiros através do telefone celular: ela é agora digital . Ainda sim, o processo de indústria cultural está instalado, mesmo com cada pessoa vendo a sua própria tela numa sala vazia. 


Referências Bibliográficas


COELHO, Teixeira. O que é Industria Cultural - 35ª. ed.. Brasiliense, 1993. Coleção: PRIMEIROS PASSOS.


Referências Complementares



SCHWARTZ, Gilson. Tecnologia Caleidoscópica. Revista Galileu. Edição 283 de Fevereiro de 2015 - Página 25 - Editora Globo


United Nations Human Rights Council: Report of the Special Rapporteur on the promotion and protection of the right to freedom of opinion and expression. Seventeenth session, 16 de Maio de 2011. Disponível em <http://goo.gl/pae19h>. Acesso em 19/03/2015.


CNPq: Jose Teixeira Coelho Netto. Currículo Lattes. Disponível em <http://lattes.cnpq.br/0856465527112284>  Acesso em 18/03/2015





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